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11 junho 2013

ÚLTIMO VOO, AMARGAS LEMBRANÇAS!



      Esta é a história real de um acidente!  Meu Acidente!

    Por mais de 10 anos passei por único culpado pelo ocorrido. Até pode ser.



    Sempre que acontece um acidente ou catástrofe, afirmamos que isso aconteceu por uma somatória de sucessivos erros, cujo desfecho deu no que deu! As pessoas envolvidas no episódio, são reais

   No dia 8 de Abril de 2000, por volta das 12:00 horas, sofri um acidente no Aeroporto de Atibaia quando eu testava um trike confeccionado pelo Uraci e recém adquirido pelo Ernesto. 

   Como sempre ajudei e ensinei alguns amigos 
tanto no voo livre, como em trike, não recusei o pedido do Ernesto, para testar o equipamento.


Itatiba 1990
    Entretanto, não sabia que o Uraci  havia realizado profundas modificações naquele trike, que  comprometeram drasticamente o seu desempenho em voo... Desconfigurou todo o aparelho que eu já havia voado alguns anos antes.

   Mudou o Centro de Gravidade (CG), fixando o trike muito avançado na quilha da asa, deixando-o demasiadamente picado. Embutiu os floaters dentro da vela da asa- Comet-, curvando para baixo, os bordos de fuga nas extremidades, que só em voo se percebia!

  Ao rolar na pista,  foram necessárias velocidade e potência máximas do motor para a decolagem!  Ao deixar o solo, em estol total, mal consegui altura suficiente para sobrevoar os hangares.

  Permaneci voando com extrema dificuldade no setor indicado para ultraleves, sobre a Rodovia Fernão Dias, mantendo potência plena no motor.  Qualquer tentativa de redução, a asa entrava num mergulho vertiginoso!  Penosamente, procurei manter o voo no setor, aguardando uma chance de pista livre para tentar por fim àquele pesadelo!

  Voava a uma velocidade acima de qualquer trike que eu já havia pilotado. Após alguns minutos, naquelas circunstâncias, uma eternidade - tendo cessado o movimento de aviões - voei em direção à cabeceira da pista.


Nata-RN 1988.
     Na reta final, com vento de proa - ao tentar uma pequena redução na potência - um afundamento incontrolável ocorreu!  Avistando  a cabeceira da pista acima da linha do horizonte, voltei à potência máxima do motor. O aparelho já não obedecia a nenhum comando! Ganhei um pouco de altura - o suficiente para tocar o bordo da pista - porém,  ele derivava para a esquerda, rápido e incontrolável!

   Todos os comandos pra sair daquela situação foram inúteis!  Só me lembro de ter visto a ponta esquerda da asa indo de encontro ao barranco! 


Porto Seguro-BA 1988.
     Senti uma pancada forte no lado esquerdo da cabeça! 

    Me vi em seguida deitado sem o capacete olhando o céu azul. Tentei mexer meus braços e pernas, mas não consegui; respirava com grande dificuldade! 

   Conclui que tinha lesionado a coluna cervical em níveis muito altos!

   A partir daquele momento, a minha luta era pela vida! 


Itatiba-SP 1991.
     O resgate chegou rápido. Eu estava consciente!

    Na UTI de um hospital em Atibaia -  recebia os cuidados de emergência - enquanto  aguardava remoção para outro hospital na cidade de Campinas!  Continuava com muita dificuldade para respirar!  Naquele momento, para o Sr Newton - Administrador do Aeroporto - a preocupação era com os problemas que o acidente poderia causar ao Aeroclube (Intervenção do D A C ).  Ao meu ouvido, insistiu para que declarasse à Polícia  que eu havia confeccionado o aparelho - que era o proprietário; que assumisse  total responsabilidade pelo ocorrido. Assumi.

    Vivi tempos difíceis nos anos que se seguiram, mas com a ajuda da minha honrada família, em nenhum momento desisti de lutar!

    Hoje sou um portador de necessidades especiais vivendo como sempre vivi: intensamente, limitado apenas  pela tetraparestesia espástica com lesão medular em C3/C4. 

    Cada dia vivido é como um presente Divino!


Ubatuba-SP - 1991.
      Ainda hoje, não encontrei uma resposta  aceitável para esta pergunta:
      Como um principiante em voo motorizado - sem nenhuma formação em aeronáutica e com um conhecimento pífio  em aerodinâmica - se acha competente para realizar consideráveis modificações estruturais e de design  numa aeronave, comprometendo radicalmente a segurança do voo?  Some-se a isso, a irresponsabilidade de vender o aparelho sem antes testá-lo pessoalmente, ou alertar o comprador sobre as mudanças!    

      Enfim, reconheço que mesmo com uma experiência de doze anos voando trike - somados a mais onze de voo livre em asa delta - cometi imperdoáveis erros, ou pecados:
     Excesso de voluntariedade;
     Confiabilidade exagerada;
     Cordialidade isenta de malícia...


    Publicado originalmente no blog vitornani em 29 Jan 2011.
Anderson Wasser disse...
Triste fato, Vitor. Tenho um colega que também ficou tetraplégico ao pular de ponta numa cachoeira e hoje ele pratica surf nas ondas da internet. Peço a Deus que te inspire com altos voos neste novo mundo!
Thiago Alencar disse...
Vitor, sem dúvida você é um exemplo de vida, de ser-humano. A sua experiência, bondade e companheirismo podem ser sentidos nas suas palavras, não há dúvida que hoje o trike no Brasil deve muito a você. Eu sou apaixonado por este esporte que você ajudou a crescer hoje voo pelos céus do brasil !!! Um grande abraço e gostaria muito de poder ter tido a oportunidade de voar com você e aprender muito com a sua experiência que conhece a essência do voo pois veio da asa-delta, não é como alguns que pensam que trike é só acelerar e subir!

Segue meu contato: thiago.alencar.sp@gmail.com

Abraços
Old Eagle disse...
Thiago.
Obrigado pelas alentadoras palavras em seu feliz comentário. Realmente você tem razão.
Eu conheci muitos "pilotos" que sequer sabiam explicar como o ar sustenta a superfície de uma
asa em voo. Nada sabiam de aerodinâmica e aceleravam um trike como se fosse uma moto. Por ser o trike, um aparelho tecnicamente simples, muitos se arvoram em sair voando sem respeitar os fundamentos necessários à própria segurança. Vamos manter contato, amigo! Abraços.
Joe Ferreira disse...
Pois é Amigo, no fundo, no fundo o que acho mesmo é que existe uma linha do destino da qual estamos sujeitos a trilhar. Me acidentei também de Asa afetando C3 e C4 mas por muita sorte as sequelas foram poucas. Claro que você tem razão quando diz que podia ter desconfiado de algo nesse Trike, mas no seu lugar provavelmente eu teria decolado como você fez. Veja a História do Ari, muito parecida. Conhecemos e confiamos tanto nessas maquininhas que jamais vamos achar que esteja assim tão errado. Daí nosso erro. Espero que sua História possa ajudar muitos pilotos. Temos que ser exigentes e não contar com sorte simplesmente. Você é um Guerreiro! Abraço forte.
Old Eagle disse...
É isso aí, Joe. Eu não soube de acidente com o Ari. Mas espero que ele esteja bem. Obrigado pelo comentário. Abraços.
Cesar Sanches disse...
Vitor, estou me interessando por trikes, desculpe se minha dúvida parecer ridícula, AINDA NA DECOLAGEM, quando percebeu que o aparelho não decolou no momento apropriado, vc chegou a pensar em aborta-la? forte abraço.
Old Eagle disse...
Sim, Cesar. O problema é que havia movimento de aviões naquele momento, inclusive na reta final. Sei também, que na maioria dos aeroportos, principalmente em Atibaia, os trikes nunca foram bem vistos pelos pilotos de avião. Imagine se um avião tiver que arremeter por causa de um trike! Se você pretende entrar para o "clube", saiba que essa é uma realidade! Com o tempo, vai descobrir porque... Bons voos! Abraços!

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